Juíza censurou site e repórter que trataram de injustiças na aplicação da lei de alienação parental
As organizações de defesa do jornalismo abaixo assinadas repudiam com veemência e consideram muito preocupante a decisão de uma juíza do Rio de Janeiro que determina a retirada da internet de vídeos e textos referentes à série de reportagens “Em nome dos pais”, do The Intercept Brasil. O material trata sobre injustiças cometidas contra mães e crianças em nome da Lei de Alienação Parental.
No último dia 30 de maio, o site e a autora das reportagens, Nayara Felizardo, foram notificados da decisão da juíza Flávia Gonçalves Moraes Bruno, da 14a Vara Cível da Comarca da Capital do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. A magistrada concedeu liminar decidindo que a repórter e o site estavam obrigados a retirar o material de jornalismo investigativo de todas as plataformas, sob pena de multa diária.
Por se tratar de tema sensível e que envolve o direito de crianças, a equipe de reportagem teve o cuidado de não citar os nomes das personagens (fossem maiores ou menores de 18 anos) para impedir a identificação, ainda que indireta. O processo judicial foi movido por homem que não é citado nas matérias, e ainda assim a juíza entendeu que a reportagem poderia causar grave dano à imagem dos requerentes, desconsiderando que a criança e seus genitores não foram identificados em nenhum momento.
A decisão ainda menciona que a reportagem foi baseada em documentos judiciais que se encontravam sob segredo de Justiça, desconsiderando, assim, as garantias constitucionais da liberdade de imprensa e a proteção ao sigilo das fontes. O próprio Intercept foi alvo de outras ações que tentam punir jornalistas pela divulgação de informações de interesse público, a despeito de proteger qualquer segredo, que não pairam sobre os profissionais da imprensa, mas sobre as partes do processo.
O jornalismo deve lançar luz sobre temas de interesse público, como é o caso de injustiças e violações que afetam o bem-estar das crianças e, por esse motivo, deve cumprir com todos os deveres de cuidado e não revitimizá-las. É lamentável que, mesmo com atenção minuciosa aos direitos daqueles que estão envolvidos no caso, jornalistas e meios de comunicação sejam punidos por revelar informações relevantes para o debate público e para a proteção do direito das crianças.
As organizações repudiam a decisão da Justiça do Rio de Janeiro que censura o livre exercício da imprensa e espera que seja revertida nas instâncias recursais. O Judiciário deve ser um aliado do exercício do jornalismo, fazendo frente às tentativas de restringir a circulação de informações de interesse público e fazendo valer a proteção constitucional concedida à liberdade de expressão e de imprensa.
2 de junho de 2023
Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)
Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca)
Associação de Jornalismo Digital (Ajor)
ARTIGO 19 Brasil e América do Sul
Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj)
Instituto Palavra Aberta
Instituto Vladimir Herzog
Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores
Repórteres Sem Fronteiras